Um morto, um gato morto.
Ao vê-lo, meu segundo se transpôs em minutos, horas...
Parecia-lhe os pelos vivos e o semblante alerta, e assim parado, mudo, como um totem.
Não havia sangue, não havia desfiguração, somente silêncio e paradeza.
Eu, como criança, estatelei meu corpo no tempo.
Ao ver um morto, meu passado e futuro se encontraram, não pelo mistério do onde vamos, mas pela ausência de si mesmo: o gato.
É provável o paralelo dessa falta de vida com a ausência de curiosidade deste tempo no qual vivemos? Há em suas esquinas uma sapiência estática, morta, a falta do que se desvirtua, a falta da procura no novo.
E não me refiro ao progresso. Penso no progresso como uma reiteração tecnológica de antigos valores. Penso no progresso e lembro-me da Reforma. Não vejo reestruturação no progresso, vejo um pesar a balança para o outro lado. E de um lado para o outro o que sobra são extremos, em sua estaticidade, enquanto um possível equilíbrio de correnteza, de movimento, torna-se cada vez mais afastado. Equilíbrio de correnteza...num rio, a constância do movimento permite à água que habitava um lugar correr para outro, e imediatamente ser substituída por outra água. As águas preenchem o lugar do que foi deixado...Assim não há insistência de se estar num lugar só...
Vejo o estado que se encontram as coisas como um enorme lago, onde cada água possui seu lugar e não há pretensão de mudança. Mas há chuva. Trazendo novas águas, e uma guerra por espaço tira as coisas do lugar...
A humanidade precisa de chuva?
Como o gato.
Um gato morto é um lago na chuva: guerra pela modificação. A morte.

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